16 Criaturas Sobrenaturais do Oriente
Youkai,
formado por “you” e “kai”. Já vimos acima o que significa
“you”. “Kai” significa “mistério”, “suspeita”, e
“aparição”. Juntando “you” com “kai”, nós temos uma
jovem mulher morta e misteriosa, geralmente bela e sedutora, que
surge do nada. Sendo essa a origem, a palavra Youkai é, na verdade,
um termo genérico para designar todas as formas de entidades e de
criaturas sobrenaturais. Fantasmas, espectros, espíritos,
shapeshifters, ogros, fadas, anjos, demônios, deuses, kamis,
sereias, etc, etc, etc, etc, sejam elas boas ou ruins, todas elas são
chamadas de youkais.
Por
isso que é tão comum ouvirmos e lermos por aí que youkais são
“demônios”. É sempre muito fácil demonizar as crenças dos
outros. Um youkai não é necessariamente bom ou mau. Assim como
temos pessoas más, vamos ter youkais maus também. Os maus são
chamados genericamente youma. Especificamente, temos outras palavras
para designar certas criaturas malvadas, como akuryou, por exemplo,
que significa uma criatura que possui uma essência espiritual
malvada, um majin, que significa um kami mau, ou mamono, que é um
bakemono mau, e assim por diante.
Yousei, nós temos uma figura feminina jovem, encantadora,
atraente e sedutora, cheia energia e vitalidade. E ainda assim é um
espírito. Que mistério da natureza será esse?
A
palavra Yousei é antiga e deriva do chinês “yaojin”, que
significa uma mulher extremamente bela. Dessa forma, Yousei também é
o termo genérico para designar as fadas e demais espíritos da
natureza, tais como elfos, brownies, ninfas, ondinas, etc.
Atualmente,
o termo é mesmo utilizado para designar as fadas ocidentais e demais
criaturas ocidentais relacionadas. Exatamente por ser uma expressão
genérica, a palavra deixou (um pouquinho apenas) de se referir às
criaturas orientais.
Poucos
são os autores que utilizam a expressão “yousei” para se
referir a criaturas não-ocidentais, mas o seu significado intrínseco
permanece: as Youseis são todas as criaturas relacionadas à
natureza ou aos espíritos da natureza.
Para
exemplificar, um kodama (espírito de árvore) é um yousei, e alguns
espíritos-animais também são considerados yousei. Tais espíritos
não se confundem com os bakemonos, pois não seriam personalidades
de animais que morreram, mas a própria essência animal no sentido
mais xamânico possível do termo. No entanto,bakemonos,
especialmente as kitsunes, podem vir a se tornar youseis com o passar
dos anos, o que colabora para o nó mental que vocês devem estar
tendo agora.
A
mãe de Abe no Seimei, um famoso e poderoso onmyouji do período
Heian, é tida como uma “fox spirit“, o espírito de uma raposa
que não é igual a uma kitsune-bakemono, sendo, portanto, uma
yousei. Ressalto que são pouquíssimos os autores que fazem essa
diferenciação terminológica, já que vocês irão encontrar o
termo “fox spirit” como sinônimo de kitsune. Mas quem estuda o
tortuoso assunto das raposas acaba por concluir a mesma coisa: as
kitsunes podem evoluir ao ponto de serem capazes de realizar façanhas
atribuídas ao kami Inari, de não poderem mais ser comparadas às
kitsunes recém desencarnadas que se contentam em pregar peças em
seres humanos e a fazer truques de ilusionismo.
Além
disso, inclusive os espíritos das mulheres, quando relacionadas à
natureza (ainda mais se forem belas) também podem ser considerados
youseis após a sua morte, como é o caso da Ame-onna, a mulher da
chuva, e da Yuki-onna, a mulher da neve.
Tennin por
vezes chamados de “fadas divinas”, “anjos orientais” ou
“anjos budistas”, os Tennin são, literamente, as Pessoas
Celestiais.
A
expressão não revela maiores mistérios. Formada pelo kanji “Ten”,
que significa “céu” e “celestial”, no sentido muito mais
sublime do que o simples “sora” dos japoneses (que significa
“céu” também, mas num sentido terreno), e “nin”, que
significa “pessoa” e “ser humano”. Os Tennin são, portanto,
as pessoas celestiais do budismo.
Os
Tennin são seres celestiais que não são de fato deidades sujeitas
a adoração, mas são servos dos Devas.
Para
o budismo, os Devas (Ten, em japonês) e demais seres celestiais,
como os Yashas (Yaksha, em sânscrito), por exemplo, são chamados de
Tenbu, que literalmente significa grupo de seres celestiais. Os Devas
(Ten), particularmente, possuem um grupo de servidores, que são os
Tennin (Apsara, em sânscrito). Todos eles são seres celestiais, mas
os Tennin estão em um patamar inferior.
Os
Tennin são geralmente representados como dançarinos ou musicistas,
quando são chamados de Gakuten. Às vezes são representados voando
pelos céus (sendo chamados de Hiten, mais conhecidos como Apsaras
Voadores), às vezes com asas, tal qual os anjos ocidentais, ou
flutuando sobre nuvens voadoras (quando são chamados de Hiten
Kouhai).
Já
as Tennyo são as Damas Celestiais.
Novamente,
a palavra não traz mistérios. Formada pelo kanji “ten” que,
como já vimos, significa “céu”, e pelo kanji “nyo”, que
nada mais é do que outra leitura para o kanji “onna”, que
significa “mulher”, as Tennyo são os Tennin femininos, ou os
Apsaras femininos, mas o termo também pode ser utilizado para
designar as divindades femininas em geral.
Também
são representadas como dançarinas ou musicistas, sempre retratadas
em posições belas e graciosas.
Bakemono,
composto pelos kanji “ba(ke)” e “mono”. O kanji “ba(ke)”
significa “mudança”, “algo que muda de forma”, e “encantar”
(com o sentido de enfeitiçar). Já “mono” significa “coisa”,
“objeto”, “matéria”.
Traduzido
como “monstro, “espectro”, “fantasma”, e “aparição”
nos dicionários, um bakemono é, literalmente, uma coisa –
geralmente espíritos de animais, mas não somente eles – que muda
de forma, tornando-se uma criatura sobrenatural.
Como
mencionado, são na maioria das vezes espíritos de animais que
adquirem um certo grau de consciência e possuem a capacidade de
mudar a sua forma para pregar peças nos seres humanos, comumente
transformando-se em belas mulheres para seduzir os seres humanos. Os
bakemonos também possuem a capacidade de evoluir, mudando a sua
própria forma, o que ocorre quando eles ganham uma cauda extra.
Os
bakemonos criados a partir de espíritos de animais são denominados
mononoke. Mononoke também traduzido por “fantasma”, “espectro”,
e outros termos genéricos, e se refere especificamente aos bakemono
que são animais.
São
exemplos de bakemono do tipo mononoke a kitsune (raposa), que pode
chegar a ter até nove caudas (kyuubi no kitsune), o tanuki
(guaxinim), o mujina (texugo), o bakeneko (gato), que quando ganha
sua segunda cauda é chamado de nekomata.
Há
também bakemonos que podem ser criados a partir de objetos
inanimados. A eles é dada a denominação de Tsukumogami. Os
tsukumogamis são tipos de bakemono que se transformam em criaturas
sobrenaturais após um longo período de tempo, geralmente após 100
anos de existência do objeto. No entanto, esse período pode ser
menor, dependendo da espécie do tsukumogami.
Atualmente,
a expressão bakemono, assim como youkai, é usada para designar
monstros em geral, mas apenas as criaturas que se enquadram na
descrição explicada acima é que são realmente bakemonos.
A
palavra Oni é composta de apenas um kanji, formado de uma imagem
pictográfica de uma criatura com uma grande cabeça e pernas
disformes. No idioma chinês, este kanji significa “fantasma”, e
era usado antigamente para designar os espíritos das pessoas que
faleceram.
Com
o passar dos anos e com o sincretismo das crenças do oriente –
quais sejam, hinduísmo, budismo, taoísmo, e, posteriormente, as
escolas budistas japonesas, o shugendou, o onmyoudou e o xintoísmo
–, a palavra “oni” passou a ser usada para designar criaturas
semelhantes ao que nós conhecemos por ogros e por trolls aqui no
ocidente, que possuem chifres, dentes afiados e grandes presas.
Com
frequência, aparecem retratados no Jigoku, o inferno budista,
trabalhando como servos de Enmma-Daioh, o Grande Rei Enma, um dos dez
juízes do inferno, razão pela qual hoje são chamados de demônios
pelos ocidentais.
Ozunu,
também conhecido como En no Gyouja, tido como o fundador do
Shugendou, uma seita asceta japonesa, derivada das escolas do budismo
esotérico japonês (Shingon e Tendai), possuía dois onis como seus
servos, Sekigan e sua esposa Koukou, que posteriormente mudaram seus
nomes para Zenki e Goki.
No
Feng Shui, a direção nordeste não é tida como auspiciosa, sendo
chamada de “Portal do Oni”.
Para
manter Onis afastados, era costume manter estátuas de macacos nos
jardins e nos telhados das casas e dos templos, especialmente virados
para nordeste.
Yuurei “Yuu”,
em japonês, significa “estar isolado”, “estar confinado em um
quarto”; com outra leitura, pode significar também “desmaiar”
e “pobreza”. Esse mesmo kanji, em chinês, significa “quietude”,
“retidão”, “escuridão” e “tranqüilidade”. Isso porque
esse kanji é formado pelo kanji “yama”, montanha, e por um duplo
radical que significa “espaços pequenos”. Assim, nós chegamos a
espaços pequenos em montanhas (cavernas), locais esses que são
escuros, quietos e tranqüilos, e que por isso são perfeitos para
executar práticas meditativas, nas quais é necessário estar
isolado para transcender a consciência e realizar projeções
astrais.
Originariamente,
“Yuurei” era a expressão para designar os espíritos das pessoas
que desencarnavam e que estavam em sua jornada rumo ao outro mundo.
Na cultura oriental, as montanhas, além de serem excelentes locais
para as práticas ascetas do Shugendou e de abrigarem os templos
budistas das sendas Shingon e Tendai, são passagens para onde as
almas eram conduzidas entre esse mundo e o outro (pesquisem sobre o
Monte Hiei, o Monte Kurama e o Monte Osore, apenas por curiosidade).
Esses espíritos eram representados sem pernas, usando uma
hitaikakushi na cabeça (um tecido triangular branco amarrado na
testa).
Como
se vê, Yuurei é mais um termo genérico que tinha o significado
original de espírito desencarnado. Com o passar dos tempos, ele
passou a assumir um significado de “aparição”, “assombração”
e “alma penada”, sendo usado atualmente para indicar os espíritos
das pessoas que morreram, mas que, por causa de assuntos inacabados,
lembranças, vingança ou raiva, não conseguem partir para o outro
mundo.
A
alma humana, como vimos, é composta por quatro partes, ou quatro
almas: sachimitama, kushimitama, aramitama e nigimitama. Eu já havia
mencionado que é o desequilíbrio na nigimitama que “segura” as
outras almas e impede o espírito de partir. Esse é o conceito que
se tem atualmente de Yuurei, tanto é que elas não são mais
retratadas usando a hitaikakushi.
A
expressão mais correta para indicar um espírito violento e
vingativo é Onryou, que surge da mesma forma explicada acima. Apesar
da ligeira mudança de significado ocorrida com a palavra Yuurei, as
pessoas ainda tendem a diferenciar esses dois tipos de espírito: um
Onryou é muito mais vingativo e rancoroso do que uma Yuurei, que
geralmente busca causar um dano físico na pessoa objeto de seu ódio.
Nesse caso, há também um desequilíbrio na aramitama, responsável
pela violência e pelas manifestações físicas que podem ocorrer
por conta de sua aparição. Já a Yuurei é um espírito mais
emocional. Em termos ocidentais, Yuureis seriam obsessores, atuando
num nível mais emocional do que físico em seu obsediado; ou aqueles
espíritos que não querem acreditar que desencarnaram, que ficam
presos em objetos e em locais (casas, museus) por causa de suas
lembranças.
A
Yuki-onna é uma entidade feminina que aparece durante as tempestades
ou as noites de neve. Por vezes é descrita tendo longos cabelos
pretos ou brancos, mas todas as histórias são unânimes ao afirmar
que ela possui a pele pálida e luminosa, fria ao toque, vestindo
sempre um kimono branco, confundindo-se com a neve.
Para
alguns autores, a Yuki-onna é o próprio espírito da neve, e assim
seria classificada como uma yousei. Para outros, ela é o espírito
de uma mulher que morreu durante uma tempestade de neve, e assim
seria uma yuurei.
Inúmeros
são os relatos de suas aparições, e as histórias variam de região
para região. Em alguns lugares, a Yuki-onna costuma aparecer no mês
de janeiro, perto do ano novo. Em outros, a youkai é uma figura
benevolente e solitária. No entanto, dizem que é ela que traz a
morte para os viajantes que se perdem durante as tempestades de neve.
A verdade é que, por ser a preferida dos poetas e dos literatos, os
contos folclóricos se misturaram com os contos inventados pelos
escritores.
A
história mais famosa sobre a Yuki-onna foi escrita por Patrick
Lafcádio Hearn, também conhecido como Koizumi Yakumo. Escritor, ele
escreveu diversos contos de fadas, um dos quais se chama Yuki-onna,
que faz parte do livro “Kwaidan”, transformado em filme em 1965.
Nesse
conto, dois lenhadores, um velho e seu aprendiz, foram surpreendidos
por uma tempestade de neve durante uma noite em que voltavam do
trabalho. Abrigados numa cabana, o rapaz viu uma bela mulher aparecer
durante a noite e soprar seu fôlego sobre o velho lenhador. Ela
aproximou-se do rapaz e, com pena por ele ser tão jovem, disse para
ele não contar a ninguém o que viu; caso contrário, ela o mataria.
Ao acordar pela manhã, ele descobriu que seu mestre lenhador havia
morrido. No ano seguinte, numa noite de inverno, ele conheceu uma
moça muito bonita, com quem acabou se casando e tendo dez filhos.
Apesar de tantos anos terem se passado, e depois de ter dado a luz a
tantos filhos, a moça continuava sempre bela. Certa noite, o rapaz,
agora um homem, contou à sua esposa do ocorrido na cabana durante a
tempestade de neve, comentando que aquela havia sido a única vez que
havia visto um ser tão belo quanto ela. A moça disse então que
aquele ser era ela, e que ela havia dito a ele que o mataria se ele
contasse a alguém; se não fosse pelas crianças, ela o mataria
naquele momento. Se algum dias as crianças tivessem qualquer
reclamação dele, ela o trataria da forma que ele merecia. Então,
transformando-se em uma névoa branca brilhante, ela desapareceu para
sempre.
Ao
pessoal old-school que curte anime, vocês podem se lembrar da
Yukina, de YuYu Hakusho, uma youkai do tipo koorime (essa
classificação foi inventada pelo anime), que significa “princesa
do gelo”. Ela, como se pode notar, foi baseada na Yuki-onna. Seu
próprio nome se assemelha ao da youkai do folclore japonês, mas a
grafia é diferente. Isso é feito propositadamente. Os manga-kas
gostam muito de brincar com o significado do nome dos seus
personagens graças ao duplo sentido que é possível dar por causa
da escrita japonesa.
A
Ame-onna é uma entidade feminina que aparece durante as tempestades
e as noites de chuva, e as histórias quanto à sua origem e às suas
aparições variam de região para região.
Para
alguns, a Ame-onna seria o próprio espírito da chuva, sendo assim
uma yousei. Na China, ela é chamada de Yao Ji, a Deusa da Montanha
Wushan.
Uma
antiga lenda chinesa conta que Yao Ji era a vigésima terceira filha
da Rainha-Mãe do Oeste. Ela era inteligente, bondosa, de
temperamento ativo. Não conseguindo mais suportar a pacata vida no
palácio celestial, ela o deixou, voando pelos céus. Ela voou sobre
milhares de montanhas e viu muitas cenas maravilhosas do mundo dos
humanos. Mas quando ela chegou às neblinas que encobriam a Montanha
Wushan, ela viu doze dragões causando problemas às pessoas e viu
Yu, O Grande, tentando controlar as águas do Rio Amarelo, que estava
inundando a região. Admirada pela determinação de Yu, Yao Jin
decidiu ajudá-lo.
Do
topo de uma nuvem, ela apontou para os dragões. Trovões começaram
a ressoar, causando o tremor da terra e das montanhas. Quanto tudo se
acalmou, os corpos dos doze dragões haviam se transformado em doze
enormes montanhas. Yu subiu ou topo da Montanha Wushan para expressar
sua gratidão para com Yao Ji, mas tudo o que ele viu foi uma singela
pedra delgada, erguida em direção aos céus. A rocha ficou
conhecida como o “Pico da Deusa”, e, desde então, contam que Yao
Ji aparece pela manhã como nuvem e à noite como chuva naquela
Montanha.
No
Japão, dizem que a Ame-onna é uma yuurei, sendo o espírito de uma
mulher que perdeu seu filho em uma noite de chuva. Outros contam que
é o espírito de uma mulher que seqüestra as crianças durante a
noite.
Sua
origem, de fato, não é importante. A verdade é que, por onde quer
que ela passe, sempre começa a chover…
Futakuchi-onna
é a Mulher de Duas Bocas.
Ao
contrário da Yuki-onna e da Ame-onna, ela não está associada a
nenhum elemento da natureza, então não pode ela ser classificada
como uma yousei. Tampouco seria uma yuurei, já que a sua
transformação em youkai teria se dado antes de sua morte. Algumas
literaturas chamam o fato de um ser humano transformar-se em criatura
sobrenatural de “maldição” ou de “doença fantasma”.
A
Futakuchi-onna possui a aparência de uma mulher normal, se não
fosse por um pequeno detalhe: ela possui duas bocas, estando a
segunda localizada atrás de sua cabeça, coberta pelos seus cabelos.
Essa segunda boca possui lábios, dentes e língua, e deve ser
alimentada regularmente.
As
histórias para a origem da segunda boca são variadas. A primeira
conta que a Futakuchi-onna seria a esposa de um avarento, e por isso
comia tão pouco. Por causa disso, a segunda boca teria surgido, para
compensar-lhe a falta de comida.
A
segunda história nos diz que a Futakuchi-onna tinha um filho e um
enteado, preterindo este último em favor de seu próprio bebê,
deixando-o morrer de fome. O espírito do enteado teria, então,
acoplando-se no corpo da mulher, criando assim a segunda boca
esfomeada atrás de sua cabeça.
A
terceira história, semelhante à segunda, conta que, após a morte
de seu enteado, um trabalhador, acidentalmente, atingiu a sua cabeça
com um machado. A ferida jamais cicatrizou, transformando-se na boca,
que constantemente fica a lembrar a mulher ter sido um erro ter
deixado a criança morrer de fome.
Dizem
que a Futakuchi-onna aparece sempre que uma madrasta odeia seu
enteado a ponto de fazê-lo morrer de fome.
“Nure”
significa “molhado”, enquanto “onna” significa “mulher”.
Logo, a Nure-onna é, literalmente, a “Mulher Molhada”. A
Nure-onna é um youkai feminino com corpo de serpente e cabeça de
mulher que vive em locais úmidos, como a beira de rios e lagos.
Ora
retratada com tronco feminino, ora apenas com a cabeça de mulher, a
Nure-onna é conhecida pelos seus longos e belos cabelos negros, os
quais fica constantemente a lavar, daí advindo seu nome. Seus
cabelos estão sempre molhados, razão pela qual é chamada de
Nure-onna. Possui também olhos de serpente e garras afiadas – este
último quando representada com membros superiores.
Dizem
que ela é uma criatura solitária, que gosta de lavar seus cabelos
nos rios e lagos sem ser incomodada. Caso a perturbem, ela sugará o
sangue de sua vítima com sua longa língua bifurcada. Para escapar
dela, no entanto, basta lhe entregar um embrulho contendo um bebê,
que a Nure-onna o deixará em paz.
Kappa,
formado pelos kanji “kawa”, que significa “rio”, “córrego”,
e “warabe”, que significa “criança”. Literalmente, “criança
da água”, o Kappa é chamado de “diabrete da água”.
O
Kappa é uma criatura pequena, do tamanho de uma criança, e tão
travessa quanto. Sua aparência se assemelha a de um anfíbio. Possui
um bico, um casco de tartaruga nas costas, e uma estranha formação
no topo de sua cabeça, que lembra um prato. Esse prato é repleto de
água, e, dizem as lendas, que é a fonte dos poderes sobrenaturais
dessa criatura. Caso a água seque, o Kappa enfraquece, podendo vir a
morrer, inclusive.
Sua
comida preferida é o pepino. Mas, apesar de seu amor por esta
cucurbitácea, o Kappa gosta mesmo é de carne, especialmente a
humana. Na sua lista de pratos prediletos, rivaliza com o pepino o
fígado humano e a shirikodama, uma mítica bola encontrada próximo
ao ânus. Por isso, são comuns os relatos de Kappas puxando cavalos
e crianças para dentro dos rios. Um antigo costume em Tóquio era
escrever o nome de sua família num pepino e atirar em um lago para
os Kappas, de modo a evitar seus ataques. Hoje em dia, não é raro,
muito menos curioso, encontrar placas próximas a rios e lagos
avisando as crianças o cuidado que devem ter com os Kappas.
Amabie e Yao Bikuni
A
palavra ningyo, formado pelos kanji “nin”, pessoa, e “gyo”,
peixe, traduzida como sereia, é utilizada para designar as criaturas
ocidentais metade peixe-metade ser humano e também as criaturas
orientais que possuem características aquáticas e humanas.
A
sereia japonesa mais famosa é, sem dúvidas, a Amabie. Amabie é uma
ningyo, cujo corpo do pescoço para baixo é coberto de escamas,
igual a um peixe. Possui um rosto humano e longos cabelos, mas a sua
boca, ao invés de ter lábios, é um bico.
Conta
o relato do Reino de Higo, antigo distrito da prefeitura de Kumamoto,
que, em meados do quarto mês do terceiro ano de Kouka, uma das
divisões do Período Edo, (mais ou menos em abril de 1846 do
calendário gregoriano), um brilhante objeto foi avistado no mar.
Todas as noites, os funcionários da cidade iam até a beira da praia
observar a intensa luz que reluzia. Quando o administrador da cidade
foi chamado para verificar com seus próprios olhos, uma estranha
criatura saiu do mar. Ela revelou se chamar Amabie e profetizou que,
durante seis anos, aquele território teria boa colheita. Mas, se uma
epidemia se alastrasse, um desenho dela deveria ser mostrado aos
doentes, que se curariam da enfermidade. Imediatamente após a sua
profecia, a Amabie retornou ao mar.
Outra
história muito conhecida de ningyo – e que possui diversas versões
– é a de Yao Bikuni, cujo nome signifca “monja budista de 800
anos”. No período Edo, já contava-se a lenda que ossos de sereia
podiam ser usados como remédio para curar qualquer doença, e que a
ingestão da carne de ningyo faria com que a pessoa vivesse para
sempre. Dizem, então, que um homem chamado Takahashi certo dia
pescou uma sereia, levando sua carne para casa. A filha deste homem,
Yao Bikuni, comeu a carne de ningyo, tornando-se jovem e imortal. Ela
casou-se, mas viu a morte de seus pais e de seu marido. Amaldiçoada
por viver eternamente, ela tornou-se uma monja, dedicando-se a ajudar
os necessitados, até que desapareceu aos 800 anos nas cavernas da
montanha do local onde nasceu.
O
Tengu, por si só, é uma criatura de origem chinesa, tendo sido
introduzido no Japão por budistas chineses. O Tengu estaria, então,
relacionado à criatura chamada Tiangou, que também significa “cão
celestial” e que possui a forma de um cão. Esta última
consideração seria óbvia se não fosse por um detalhe: os Tengu
não se parecem em nada com cachorros: eles são retratados como
pássaros ou semelhantes a homens com longos narizes.
Tendo
sido trazido por monges budistas da China, o Tengu logo foi absorvido
pelos yamabushis, os praticantes do Shugendou, uma tradição asceta
japonesa de origem budista que reúne elementos da escola Shingon, da
escola Tendai e do Xintoísmo com práticas de artes marciais.
Yamabushi significa “aquele que vive na montanha” e, por isso,
também os Tengu passaram a ser conhecidos como criaturas que vivem
nas montanhas e florestas, bem como são considerados os patronos das
artes marciais, mestres de guerreiros, samurais e ninjas.
Não
tardou para que os Tengu fossem elevados ao status de kami, sendo
considerados kami das montanhas e das florestas. Antigos textos
xintoístas dizem que os Tengu seriam crias de Amanozako, uma kami
feroz gerada pela raiva de Susanoo. Ainda no xintoísmo, ele foi
associado ao kami Sarutahiko, o principal kami da terra, pois este
também possui um longo nariz.
Tradicionalmente,
eles eram retratados como criaturas malvadas, que gostavam de pregar
peças nos seres humanos e de tentar os samurais e monges budistas,
principalmente os pretensiosos e arrogantes, características que,
por vezes, eles próprios manifestam. Por isso, ainda hoje a
expressão Tengu é usada para designar uma pessoa orgulhosa e
vaidosa.
Os
Tengu são classificados em Daitengu e Kotengu, ou Grande Tengu e
Pequeno Tengu, respectivamente. Os Daitengu são os Konoha Tengu
(Tengu das Florestas), também chamados de Yamabushi Tengu, e possuem
longos narizes. Já os Kotengu são os Karasu Tengu, ou Tengu Corvos.
Eles também se vestem como yamabushis, assim como os Daitengu, mas
possuem bicos de corvos ao invés do longo nariz característico.
Assim,
Bakeneko é o “gato que muda de forma”. É o espírito de um gato
que, ao morrer, se transforma em um Mononoke, uma espécie de
Bakemono, ou seja, um espírito animal que se transforma num tipo de
criatura sobrenatural e cuja principal habilidade é mudar de forma.
Os
Bakenekos, portanto, são famosos pelas peças e truques que pregam
nos seres humanos devido à sua habilidade de mudar de aparência,
como toda sorte de Mononokes, tais como as Kitsunes (raposas) e
Tanukis (guaxinins).
Mulheres
bonitas andando sozinhas à noite eram sempre vistas com
desconfiança, pois poderiam ser Bakenekos disfarçados. Quando uma
lamparina subitamente se apagava, suspeitava-se ser obra de um
Bakeneko que teria lambido todo o seu óleo quente, que era feito de
peixe.
Algumas
lendas nos dizem ainda que o gato não precisa necessariamente morrer
para se transformar em um Bakeneko: se for um gato de grande porte,
após ser alimentado por treze (ou três) anos. Além disso, gatos
com caudas longas também eram vistos com suspeitas, razão pela qual
era costume também cortá-las bem curtas. Isso porque um gato com
uma longa cauda poderia tê-la dividida, transformando-se, assim, em
um Nekomata.
Nekomata,
composto pelos kanji “neko” e “mata”. “Neko”, como vimos,
significa “gato”. “Mata”, por sua vez, significa
“bifurcação”.
O
Nekomata é o “gato de duas caudas”. Dentre os Mononokes, quanto
mais evoluído e/ou mais velho for o espírito animal, mais caudas
ele vai ganhando. O exemplo mais famoso de Bakeneko > Mononoke que
vai ganhando caudas é a Kitsune, que quando completa mil anos,
adiquire a sua nona cauda, sendo chamada então de Kyuubi no Kitsune
(literalmente, raposa de nove caudas).
Assim,
o Nekomata é o Bakeneko que adquiriu experiência e teve a sua cauda
dividida. Por isso que as caudas dos gatos eram cortadas, pois se
acreditava que um gato de cauda curta jamais se tornaria um Bakeneko,
por não poder se tornar um Nekomata.
Além
das tradicionais habilidades dos Bakenekos, os Nekomatas conseguem
controlar cadáveres de outros seres, incluindo humanos, como se
fossem marionetes, e por onde passam é possível observar um fogo
espectral ao seu redor.
Shishi
é uma criatura cuja aparência é a de um leão. Sua origem remonta
à Índia, uma vez que leões não são nativos das regiões da
China, da Coreia e do Japão. A figura do leão chegou até essas
culturas a partir do Budismo, que, através da Rota da Seda, alcançou
a China e a Coreia, até chegar ao Japão. Inicialmente, sua
aparência era eminentemente leonina, até ganhar traços mais
caninos. No entanto, sua função é a mesma em todos esses
territórios: Shishi é um guardião.
Sempre
representado em pares, um à direita e outro à esquerda, Shishi é o
guardião de templos budistas e xintoístas, responsável por afastar
os maus espíritos. Sua imagem também é colocada nos beirais dos
santuários, como telhas decorativas chamadas de Onigawaras, na
tradicional posição nordeste, como já vimos antes por aqui.
Na
China, o leão é o mestre de todos os felinos, o defensor da lei e o
protetor dos prédios sagrados. É um símbolo de poder e sucesso,
realeza e força. Por isso, sua imagem era bordada nas roupas da
corte. Na Coreia, acredita-se que a pele da cabeça de um Koma-inu é
mais forte do que um capacete.
No
Japão, como já mencionado, Shishi é o guardião dos santuários e
templos religiosos, bem como dos túmulos. Aparece sempre em pares,
sendo um masculino e outro feminino. Um é retratado de boca fechada;
o outro, de boca aberta. O de boca aberta representa o leão
propriamente dito (Shishi) e está localizado à esquerda, enquanto o
de boca fechada retrata a mistura entre leão e cachorro (Koma-inu) e
está localizado à direita.
Com
o tempo, essa diferenciação entre os dois foi desaparecendo. Sua
aparência se tornou indistinguível, exceto pelas bocas abertas e
fechadas, e as expressões Shishi e Koma-inu passaram a ser
utilizadas para ambos. Apesar disso, os dois ainda promovem a
guarnição espiritual dos territórios sagrados dos templos,
afastando as energias negativas desses locais.
Tanuki,
em japonês, é o nome dado ao animal nyctereutes procyonoides,
originário da Terra do Sol Nascente, chamado de raccoon dog em
inglês e cão-guaxinim em português. Ou simplesmente guaxinim.
O
comportamento do Tanuki muito se assemelha ao da Kitsune, a
famigerada raposa que aparece em diversas lendas japonesas. Possui a
mesma propensão de pregar peças nos seres humanos, transformando
folhas em dinheiro, ou a si próprio em objetos inanimados ou em
belas jovens a fim de seduzir rapazes, assim como a maioria dos
Bakemonos.
Hedonistas,
os Tanukis são especialmente conhecidos por adorarem comida, sakê e
mulheres, não necessariamente nesta ordem.
Outra
característica particular envolve os seus testículos. O animal
tanuki possui testículos naturalmente maiores. No folclore, se
assoprados e esticados, os testículos de um Tanuki podem atingir o
tamanho de cerca de 8 tatamis. Na arte gráfica cômica tradicional
japonesa, o Tanuki é retratado utilizando seus testículos de
diversas maneiras, tais como rede de pescar, barco, capa de chuva, ou
até mesmo cobertor.
Esse
tipo de representação é apenas uma forma de humor, não tendo
conotação sexual ou à fertilidade. No entanto, imagens de Tanuki
são consideradas como amuletos de boa sorte e de prosperidade. Isso
porque antigamente, na metalurgia, a pele do animal tanuki era
utilizada para trabalhar o ouro, razão pela qual o youkai foi
associado a este metal precioso. Também é por isso que é dito
possuírem os Tanukis “kintama”, literalmente “bola de ouro”,
uma forma coloquial de se referir a testículos.
Dependendo
da forma e da localidade onde aparece, o Tanuki pode receber nomes
diferentes. Na província de Kagawa, em Shikoku, ele é chamado de
Ashimagari. Às vezes, também pode ser chamado de Bakedanuki,
referenciando ao grupo dos Bakemono.