BREVE INTRODUÇÃO MAGICA IV
Separei
um trecho do livro “O Poder do Mito”, que é uma entrevista com
Joseph Campbell, um dos melhores pesquisadores que o mundo já teve
na área de mitologia comparada, para poder terminar de esclarecer
sobre o ponto do experimento do último capítulo:
“MOYERS:
Como transformamos nossa consciência?
CAMPBELL:
Depende do que você esteja disposto a pensar a esse respeito. E é
para isso que serve a meditação. Tudo o que diz respeito à vida é
meditação, em grande parte uma meditação não intencional. Muitas
pessoas gastam quase todo o seu tempo meditando de onde vem e para
onde vai o seu dinheiro. Se você tem uma família para cuidar,
preocupa-se com ela. Essas são todas preocupações muito
importantes, mas, na maior parte dos casos, têm a ver apenas com as
condições físicas. Como você pode transmitir uma consciência
espiritual às crianças se você não a tem para você mesmo? Como
chegar a isso? Os mitos servem para nos conduzir a um tipo de
consciência que é espiritual.
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Apenas
como exemplo: eu caminho pela Rua 51 e pela Quinta Avenida, e entro
na catedral de St. Patrick. Deixei para trás uma cidade muito
agitada, uma das cidades economicamente mais privilegiadas do
planeta. Uma vez no interior da catedral, tudo ao meu redor fala de
mistérios espirituais. O mistério da cruz – o que vem a ser,
afinal? Vejo os vitrais, responsáveis por uma forte atmosfera
interior. Minha consciência foi levada a outro nível, a um só
tempo, e eu me encontro num patamar diferente. Depois saio e eis-me
outra vez de volta ao nível da rua. Ora, posso eu reter alguma coisa
da consciência que tive quando me encontrava dentro da catedral?
Certas preces ou meditações são concebidas para manter sua
consciência naquele nível, em vez de deixá-la cair aqui, o tempo
todo. E, afinal, o que você pode fazer é reconhecer que isto aqui é
apenas um nível inferior ao daquela alta consciência. O mistério
expresso ali está atuando no âmbito do seu dinheiro, por exemplo.
Todo dinheiro é energia congelada. Creio que essa é a chave de como
transformar a sua consciência.”
Bom,
se temos o mundo físico modificando o mundo das ideias, podemos
também utilizar o mundo das ideias para modificar o mundo físico. A
base desse raciocínio é a de que as atitudes que tomamos no mundo
físico são baseadas no nosso processo cognitivo; uma definição
para cognição pode ser “O conjunto dos processos mentais usados –
no pensamento – na classificação, reconhecimento e compreensão
para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de
determinados sistemas e soluções de problemas. De uma maneira mais
simples, podemos dizer que cognição é a forma como o cérebro
percebe, aprende, recorda e pensa sobre toda informação captada
através dos cinco sentidos.”
É
aqui que entra o axioma mágico “Fake until you make it”, ou
“Finja até ser/fazer de fato”. Fazendo alguma coisa repetidas
vezes, programamos nosso cérebro a adotar aquele padrão como uma
fórmula a ser seguida no nosso dia a dia ou em situações
específicas.
Um
exemplo simples: repita (falando com sua voz, não somente em
pensamentos) consigo mesmo “Vai dar certo!” antes de fazer
qualquer coisa que julgue relativamente difícil e que já tenha
feito antes, para sentir a diferença em seus pensamentos (bom para
acabar com bloqueios e travas, não deixa vir o famoso “branco”
que te impede de lembrar de algo que você sabe).
“Uma
fórmula mágica é um enunciado de como um fato ou teoria
cosmológica é percebido. Uma fórmula mágica se desenvolve a
partir de outra mais antiga, do mesmo modo como aumenta a habilidade
humana de perceber a si mesmo e o Universo. Uma mudança na
consciência torna necessária uma alteração na fórmula mágica.
Isso não significa que a velha fórmula nunca mais funcione, mas
apenas que a nova se revela muito melhor.” DUQUETTE,
Lon Milo. 2007. A Magia de Aleister Crowley – Um manual dos Rituais
de Thelema. São Paulo: Madras.
Ou
seja, alguém consegue chegar num certo nível de consciência e,
então, após ter o devido entendimento
de como chegou até este nível, cria uma fórmula mágica que pode
ajudar outras pessoas a chegarem também. Basicamente, é assim que
funciona a magia a ritualística, os rituais são formados através
da mistura de fórmulas mágicas, de modo que um padrão seja
atingido com a pessoa alterando seu nível de consciência através
das falas e encenações.
Um
tipo de fórmula mágica que vale a pena ser frisada é o Símbolo. A
palavra ‘símbolo’ vem do Grego e significa “Aquilo que une”
(enquanto ‘diábolo’ significa “Aquilo que separa”). É um
tipo específico de signo, geralmente transmite mais ideias do que as
óbvias; vem de uma prática muito comum que é criar uma imagem para
representar a ideia que une um grupo de pessoas ou empresa, feito com
o intuito de que toda vez que estas pessoas olharem para ele, se
lembrarão dos princípios e ideais que levaram à criação do grupo
e como estão conectadas a esta criação, sendo assim este signo
recebe a qualidade de símbolo.
Um
exemplo prático, uma aliança de casamento é um ‘símbolo’,
pois representa o que une duas pessoas, enquanto uma carta de
divórcio é um ‘diábolo’, pois representa o que separa duas
pessoas.
No
processo de iniciação em uma ordem iniciática, a pessoa recebe uma
introdução à base simbólica dela, de modo que a pessoa começa a
aprender como aquele grupo pensa e o que os torna um grupo. Com o
devido aprendizado a pessoa começa a conseguir alterar sua
consciência com os símbolos da ordem e tornar seu corpo de ideias
mais próximo ou harmonizado com o dos outros membros; o problema
aqui é que aprender sobre um símbolo não é apenas ler em um livro
sobre o que falaram dele, mas o aprendizado também está no plano
dos sentimentos – aprender sobre que emoções aquele símbolo pode
causar – que é o plano logo acima do plano das ideias, como foi
dito na parte 3. Portanto, para se conectar concisamente com um grupo
desses é necessário passar por uma série de estudos, experiências
e rituais, de maneira que só assim a mudança será concisa e a
pessoa será digna de falar e agir em nome do grupo e de seu
trabalho.
É
exatamente por isso que muitas ordens são fechadas e exigem certo
nível de compreensão sobre alguma coisa antes do pretendente ser
iniciado, caso a pessoa não tenha este tipo de compreensão os
objetivos dos símbolos podem ser deturpados e isso pode atrapalhar
futuros membros que ainda não tiveram a devida explicação, o que
possivelmente provocará uma mudança de sentido no grupo ou
fatalmente o destruirá, como já aconteceu com diversas ordens. Para
tentar evitar isso, a maioria das ordens ensina os significados de
maneira gradual, ou seja, cada pessoa ocupa um grau e vai aprendendo
e experimentando os estados de consciência de acordo com seu
merecimento; uma vez que chegam nos últimos graus terão grande
possibilidade de atingir um grau de consciência similar ao que os
criadores da ordem intencionavam que os membros atingissem.
Aliás,
o nome “membros” vem exatamente daí, cada grau da ordem (o corpo
todo) te ensina sobre o funcionamento de um pedaço do corpo e,
incorporando os fundamentos de todos, você se torna este corpo.
Na
fala de Joseph Campbell citada no começo deste capítulo, ele se
pergunta sobre o mistério da Cruz, o que é este símbolo para um
cristão? A cruz os lembra, toda vez que olham para ela, de um ato de
compaixão, que é doar sua própria vida ou se arriscar por quem
ama. A compaixão é tida como uma qualidade muito importante para
manter um grupo de pessoas unidas, ou até mesmo uma sociedade, sendo
um dos alicerces de grande parte dos grupos aqui no Brasil. Assim,
sempre que alguma pessoa entra em contato com uma cruz, caso tenha
sido iniciada em tal mistério, seu corpo de ideias é relembrado da
ideia e ela consegue tomar decisões tendo aquilo em mente.