Os cinco elementos no Xamanismo, no Tantra e no Dzogchen do Tibete
Os cinco elementos no Xamanismo, no Tantra e no Dzogchen do Tibete
"Na
cultura tibetana, os cinco elementos – terra, água, fogo, ar e
espaço – são considerados a substância de todas as coisas e
processos. O estudo de suas interações permeia o pensamento
tibetano. O conhecimento dos elementos forma a base da medicina, da
astrologia, do calendário e da psicologia, assim como as tradições
espirituais do Xamanismo, do Tantra e do Dzogchen.
Os
nomes dos elementos são simbólicos. Eles definem qualidades e modos
de ação específicos por analogia com os elementos conhecidos do
ambiente natural. Como acontece na maioria das culturas, a tradição
tibetana usa os elementos naturais como metáforas fundamentais para
descrever forças internas e externas. As propriedade físicas, por
exemplo, são atribuídas aos elementos: a terra é a solidez, a água
é coesão, o fogo é temperatura, o ar é movimento e o espaço é a
dimensão espacial que concilia os outros quatro elementos ativos.
Além disso os elementos estão associados a diferentes emoções,
temperamentos, direções, cores, sabores, tipos de corpo e caráter,
doenças e estilos de pensamentos. Dos cinco elementos vem os cinco
sentidos e os cinco campos de experiência sensorial; as cinco
emoções negativas e as cinco sabedorias; e as cinco extensões do
corpo. Eles são os cinco pranas ou energias vitais. São os
componentes de todo fenômeno físico, sensorial, mental e
espiritual.
O
uso metafórico dos cinco elementos também é usual nas línguas
ocidentais: uma pessoa pode ser aérea ou ter os pés na terra, pode
ser fluida ou fogosa. A raiva é quente, a tristeza é molhada. Uma
atitude pode ser arejada ou terra-a-terra.
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Mas
nas tradições tibetanas os elementos não são entendidos só
metaforicamente: os elementos da natureza são uma representação
concreta de uma distinção mais sutis e fundamental dos cinco
aspectos da energia primordial da existência. Não existe nada em
nenhuma dimensão, que não seja totalmente composto pelas interações
desses cinco aspectos da energia. Os processos elementares criam,
Mantém e finalmente destroem o universo. Isso vale também para os
seres individuais: no nascimento, o jogo dos elementos cria o corpo,
a mente e a personalidade.Na hora da morte esses se dissolvem à
medida que os elementos se desorganizam. Além disso, durante a
vida, a relação da pessoa com os elementos determina a qualidade da
experiência.
A
idéia de elementos traz poucos benefícios quando se limita a uma
abstração, a uma forma de dividir tudo por cinco. A compreensão
dos elementos é útil quando está relacionada à experiência e é
usada positivamente para melhorar a qualidade da nossa vida. Mas
antes de poder aplicar esse conhecimento temos que nos familiarizar
com os elementos, começando a nos relacionar com eles por meio de
imagens e metáforas.
O
corpo humano evoluiu por centenas de milhares de anos mediante a sua
relação com o ambiente físico. Essa história fica evidente na
satisfação que sentimos diante da beleza natural; a interação com
os elementos naturais pode curar e renovar. Apreciamos a terra limpa
do deserto e o solo fértil do jardim. Tiramos férias à beira do
mar, perto de um rio ou de um lago. Relaxamos no banho. Ficamos
extasiados pela chama e gostamos do calor do sol ou do fogo na
lareira. Inspiramos profundamente para nos acalmar, suspiramos para
afugentar a trsteza, visitamos as montanhas para nos sentir
revigorados pelo ar puro. E o céu, a imagem externa do espaço nos
fascina – a cor, as manifestações atmosféricas que ele exibe e a
luz que o permeia. Relaxamos em espaços vastos e abertos e nos
sentimos seguros em espaços fechados e confortáveis. Ou ficamos
ansiosos em espaços amplos e sentimos claustrofobia em espaços
fechados. De uma maneira ou outra reagimos. Quando ficamos privados
de um dos elementos, ansiamos por ele. No deserto ficamos felizes
quando encontramos água. Depois de um longo tempo no mar, temos
vontade de beijar a terra quando desembarcamos. Quando estamos com
frio, corremos para o fogo. Os cinco elementos nos afetam
profundamente num nível profundo e instintivo, mas geralmente nos
perdemos na superfície dessas experiências, sem perceber que a
intimidade com os elementos pode nos ligar ao sagrado e nos conduzir
à cura, ao equilíbrio e ao entendimento mais profundo de nós
mesmos.
Pode
ser que cinco elementos seja muito pouco para explicar toda a
diversidade das coisas e dos seres, mas os cinco elementos são cinco
distinções que se ramificam continuamente em outras divisões
sutis.
Essa
compreensão pode ser aplicada ao corpo, por exemplo. O tronco tem
cinco apêndices principais:duas perna, dois braços e uma cabeça.
Cada um desses se divide em outros cinco: cada braço e cada perna em
cinco dedos, a cabeça nos cinco órgãos dos sentidos.
Uma
formulação tradicional define a carne como terra; o sangue e outros
fluidos do corpo como água, a energia elétrica e química, bem como
o calor do metabolismo como fogo; a respiração, o oxigênio e
outros gases como ar; e o espaço que o corpo ocupa, os espaços
dentro do corpo e a consciência como elemento espaço. Cada um dos
cinco pode ainda ser analisado ainda em termos de elementos: só na
carne são encontradas a solidez (terra), a coesão (água), a
temperatura (fogo), a motilidade (ar) e a consciência (espaço).Essas
divisões também podem ser aplicadas ao sangue: nele há sólidos,
fluidez, temperatura, movimento e espaço. Além disso, é claro,
cada uma das subdivisões pode ser aplicada a outras decomposições
em cinco, até que finalmente, qualquer coisa possa ser reduzida a às
cinco energias elementares essenciais.
As
interações dos cinco elementos dão origem não apenas a partes do
organismo, a corpos, planetas, programas de computador e árvores,
como também a todos os domínios da existência em cada dimensão. O
dinamismo dos cinco elementos é subjacente a tudo o que existe.
OS
TRÊS NÍVEIS DA PRÁTICA ESPIRITUAL
O
uso dos elementos na prática espiritual varia, dependendo de a
abordagem ser do Xamanismo, do Tantra ou do Dzogchen. Ou seja, o
nível externo, interno ou secreto.
EXTERNO
Externamente
os elementos não são apenas os elementos brutos da nossa
experiência sensorial – a terra onde vivemos, a água que bebemos,
o fogo que nos aquece, o ar que respiramos e o espaço através do
qual nos movemos: são também os espíritos ligados a eles. Entre
estes estão as deusas, os espíritos elementais e outros seres.
Trabalhar com esses seres é uma prática muito comum na cultura
tibetana e pertence ao domínio do que estou chamando de Xamanismo,
embora eu queira deixar claro que não existe a palavra “xamanismo”
na linguagem tibetana.
As
tradições tibetanas que trabalham com os espíritos vem da Tradição
Bön, mas hoje são encontradas em toda a cultura tibetana. No Tibete
muitas decisões de dirigentes e altos lamas de mosteiros de todas as
seitas são tomadas com base em consultas a oráculos humanos e seres
não físicos. Os tibetanos não gostam de igualar essas práticas ao
xamanismo, porque para alguns, a palavra está relacionada ao
sacrifício de animais ou uma espiritualidade mais primitiva. O que
estou discutindo aqui, não tem relação alguma com essas coisas.
Trata-se de práticas ensinadas nos quatro primeiros dos nove níveis
de ensinamentos do Tradição Bön dos Tesouros do Sul dos
ensinamentos Bön.
INTERNO
Os
elementos internos são energias elementares e não suas formas. No
corpo, são as energias físicas que bombeiam o sangue, digerem
comida e estimulam os neurônios, bem como as energias mais sutis das
quais dependem a nossa saúde e as nossas faculdades. Algumas dessas
energias sutis são hoje estudadas no Ocidente graças a uma nova
familiaridade com os modelos médicos orientais que informam a
Acupuntura e os novos usos que pesquisadores ocidentais da área
médica estão descobrindo para diferentes tratamentos vibratórios.
Existem também energias muito mais sutis que não podem ser
detectadas por medições físicas, mas que estão disponíveis à
experiência direta por meio das disciplinas yogues e contemplativas.
Esse nível mais sutil da energia elementar não é encontrado apenas
dentro do corpo, mas é também a dimensão de energia que os
profissionais competentes de Feng Shui – a arte chinesa da
disposição dos objetos – sentem no ambienta. São também as
manifestações de energia que se avolumam nos fenômenos de grupo
como o comportamento das multidões, o patriotismo e coisas assim. O
Tantra trabalha com essas energias guiando-as no corpo com propósitos
específicos, por meio de métodos yogues diretos que envolvem
postura, respiração, visualização e mantra. O Tantra vê as
energias como forças divinas.
SECRETO
A
dimensão secreta dos elementos existe além da dualidade, sendo
portanto difícil de descrever por meio da linguagem, que divide
necessariamente a experiência em objetos separados. Essa dimensão
extremamente sutil da experiência é a radiância do Ser, as “cinco
luzes puras” aspectos da luminosidade que, inseparavelmente ligada
ao vazio, é a base de tudo. As práticas e ensinamentos ligados a
esse nível dos elementos, são extraídos do Dzogchen, a Grande
Perfeição.
Essa
três dimensões só são separadas conceitualmente. Esse é um ponto
importante que deve ser considerado durante a leitura deste livro. É
um erro achar que os níveis externo, interno e secreto podem ser de
fatos divididos, ou que a prática externa, o Tantra, e o Dzogchem
são mutuamente exclusivos. A confusão sobe esse ponto leva a muitas
divisões na crença: religiões que desconsideram a vida do corpo,
culturas seculares que desconhecem a natureza sagrada da Terra, ou
preocupações com o bem-estar material que negligenciam o
desenvolvimento espiritual. A vida como um todo é importante e vem
dos elementos sagrados.
A
visão do Dzogchen é completa e engloba as outras, mas isso não
significa que as visões inferiores devam ser negligenciadas.
Acreditar que tudo é luminosidade insubstancial é muito diferente
de conseguir atravessar paredes. A prática mais elevada é a mais
eficaz e não necessariamente a que é categorizada como “superior”."